SOBRE A NOVA REGULAMENTAÇÃO DO ABORTO DE MACRON

 

          O presidente francês, Sr. Macron, em seu mais recente discurso ao Parlamento Europeu, no início da presidência francesa do Conselho da UE, anunciou, surpreendente e traiçoeiramente, o reconhecimento, em toda a Europa, do aborto como um direito fundamental da pessoa, o que significaria impor esse direito, como tal, na legislação de todos os Estados.

            Creio que o presidente francês ou não se deu conta do que fez ou sofreu uma grave demência ou perdeu o juízo. E, ante este fato, os cristãos, a maioria europeia, os Estados da UE, e eu mesmo, que não sou ninguém politicamente falando, só mais um cidadão europeu, bispo e cardeal da Igreja Católica, não podemos permanecer em silêncio. Sinto o dever moral, em consciência, de me pronunciar. E o faço com este artigo de rejeição diante do cruel absurdo de Macron. Trata-se de um assassinato, de um infanticídio.

            O aborto provocado é, em si, uma ação gravemente imoral. Chamando as coisas por seu nome: abortar é matar ou assassinar o próprio filho. É uma violação do direito fundamental à vida, base da convivência entre os homens e da vida em sociedade. É um crime contra a pessoa. O aborto é um holocausto silencioso que não nos pode deixar indiferentes, não digo apenas os cristãos de todo o mundo, mas também os responsáveis ​​pela coisa pública, que devem pensar no futuro das nações.

            Quem nega a defesa à pessoa[1] mais inocente e frágil, pessoa já concebida, embora ainda não nascida, comete uma gravíssima violação da ordem moral. Que sentido tem falar da dignidade do homem, dos seus direitos fundamentais, se não se protege um inocente ou chega-se inclusive a fornecer os meios ou serviços, privados ou públicos, para destruir vidas humanas indefesas?

            A introdução e o desenvolvimento de uma legislação permissiva sobre o aborto, a ponto de considerá-lo um direito – o direito de matar – tem sido avaliado como a afirmação de um princípio de liberdade. Perguntemo-nos se não foi, em contrapartida, o triunfo do bem-estar material e do egoísmo sobre o valor mais sagrado, o da vida humana?

            Diz-se que a Igreja foi derrotada porque não conseguiu que a sua norma moral fosse aceita. Creio, porém, que, nesse tristíssimo e involutivo acontecimento, quem saiu derrotado foi o homem, foi a mulher. No caso de Macron, foi a Europa: isso é distintivo de um presidente europeu ou, ao contrário, é a sua negação? Foi derrotada a sociedade baseada sobre o bem comum; derrotado o médico que renegou o juramento e o título mais nobre da medicina: defender e salvar a vida; ou foi o Estado secularizado ou a União dos Estados, que renunciou à proteção fundamental e ao sacrossanto direito à vida para tornar-se instrumento de um presumido interesse da coletividade?

            Não há justiça num país que permite o assassinato de inocentes. Ao considerar o aborto como um direito humano fundamental, um continente como a Europa carece de futuro.

            Um dos deveres fundamentais do Estado é proteger a vida dos seres humanos. Sem a proteção desse direito, o Estado, ou a união dos Estados, mina as bases sobre as quais toda sociedade deve se assentar. Não podemos nos esquecer de que “os direitos fundamentais da pessoa devem ser reconhecidos e respeitados pela sociedade civil e pela autoridade política. Tampouco representam uma concessão da sociedade e do Estado. No momento em que uma lei positiva priva uma categoria de seres da proteção que a legislação civil deve prestar, o Estado nega a igualdade de todos perante a lei” (Donum Vitae, III).

            O aborto é um crime que nenhuma lei humana pode pretender legitimar. Legislação desse tipo estabelece uma grave e precisa obrigação de a ela se opor por meio de objeção de consciência; nunca é lícito participar de uma campanha de opinião a favor de semelhante lei, nem dar-lhe o sufrágio de seu próprio voto favorável.

            Pode-se obrigar um Estado da UE a introduzir este “novo direito” em sua legislação própria? Nações como a Polônia teriam de abandonar a UE ou de ser expulsas da União? Mais divisão no seio da Europa, quando ela tanto necessita de unidade? Sr. Macron, o senhor não sabe o que fez: a quem o senhor obedece: a comandos maçônicos, à moda, ao feminismo radical antifeminista, à Nova Ordem Mundial? Por que não segue os princípios dos fundadores, De Gaulle, Adenauer, De Gasperi..., aos quais o senhor está vinculado pela presidência que exerce?

Sincera e humildemente, creio que todas as conferências episcopais europeias, órgãos correspondentes da Santa Sé, universidades católicas, associações a favor da família e da vida, deveriam dizer uma palavra a favor da vida e de rejeição à indigna pretensão do senhor Macron. Peço e espero tal pronunciamento.


            Cardeal Antonio Cañizares, arcebispo de Valência (Espanha).

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