INSTITUIÇÕES CENOBÍTICAS
Ela é, segundo o estudioso Luc Brésard, O. Cist., para “os cenobitas uma rica doutrina espiritual baseada naquela dos Padres do deserto, que seu mestre [Evágrio – nota nossa] havia sintetizado. São Bento leu esta doutrina e, por isso, recomendou sua leitura no capítulo 73 de sua Regra” (A Espiritualidade monástica das origens. Juiz de Fora: Subiaco, 2022, p. 211). Digno de atenção é o como, já a partir da descrição do hábito dos monges, Cassiano supera Evágrio na amplitude de detalhes. Enquanto este se serve apenas do breve Prólogo, em 9 parágrafos, aquele dedica um livro (= capítulo) inteiro – o primeiro – ao tema (cf. pp. 35-46).
Isto posto, pergunta-se: Qual é, em suma, o conteúdo de Instituições Cenobíticas? – Em resposta, diremos que a obra está dividida em duas grandes partes. A primeira é prática, ou seja, trata do dia a dia do monge; a segunda é espiritual, isto é, voltada aos pensamentos que atacam o monge. A parte I expõe o simbolismo da veste do monge (livro I), a Oração da Noite, muito valorizada no monaquismo (livro II), a Oração do Dia, já aparecem aí as chamadas horas de Terça, Sexta e Noa e mais um Ofício da manhã, que foi acrescentado no Ocidente (livro III). O livro IV, a tratar da formação daqueles que renunciam ao mundo, está dividido em quatro partes: Introdução (capítulos 1 e 2); A Formação na vida monástica (cap. 3-10); A Vida no mosteiro (cap. 11-22) e, por fim, o nome de alguns monges exemplares (cap. 23-43).
Na parte II da obra, Cassiano se volta para a doutrina de Evágrio sobre os pensamentos (cf. Tratado Prático, n. 6ss., Ed. Benedictus). Trata do espírito da gula (livro V), da prática da fornicação (livro VI), da avareza (livro VII), da cólera (livro VIII), da tristeza (livro IX), da acídia ou acédia (livro X), da vanglória (livro XI) e do orgulho (livro XII). A longa introdução de Dom Justino de Almeida Bueno, OSB (cf. pp. 9-27), e, nas páginas finais, os dois mapas (cf. pp. 317-318) muito ajudam o leitor a se posicionar no precioso universo temporal e geográfico da escrita de João Cassiano que é, sem dúvida, um dos pilares do monaquismo antigo.
A respeito da acídia – abordada no livro X da parte II – lemos que ela pode ser também chamada de “tédio ou ansiedade do coração. Próximo da tristeza, este adversário prova principalmente os solitários, ataca com mais frequência e mais duramente aqueles que vivem no deserto. É sobretudo por volta da sexta hora que perturba o monge; em horas fixas – como uma febre que retorna periodicamente – instiga sua alma doente pelos ardores violentos que nela acende. Alguns anciãos [refere-se a Evágrio. Tratado Prático, 12 – Nota nossa] dizem que é o ‘demônio do meio-dia’ do qual fala o Salmo 90 (Sl 90 [91],6)” (p. 245). Depois de expor os meios de combatê-la, conclui: “A experiência prova, então, que não se escapa à tentação da acídia pela fuga, mas que é necessário superá-la, resistindo-lhe” (p. 268).
Eis, pois, uma obra que, junto com as Conferências, do mesmo autor – a serem apresentadas oportunamente – exerceram forte influência no monaquismo ocidental. Daí Dom Justino escrever: “Esse papel ímpar de Cassiano, através de seus escritos portadores de fervor e do espírito do monaquismo oriental, é reconhecido por nosso Pai São Bento quando apresenta as Conferências e Instituições como o modelo de livro a ser lido em comunidade” (p. 20).
Parabéns às Edições Subiaco por mais esta rica obra que, em 2021, já estava na segunda reimpressão.
Vanderlei de Lima é eremita de Charles de Foucauld
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