JONAS ENGOLIDO PELA BALEIA?
O livro bíblico de Jonas é popularmente famoso por narrar a história de um profeta que, engolido por um grande peixe, foi, depois de três dias e três noites, regurgitado na praia. Pois bem, esta cena voltou à baila, nos últimos dias, após um jovem de 23 anos ter sido tragado por uma baleia-jubarte no litoral do Chile, e, de imediato, expelido de volta ao mar. O presente artigo comenta os fatos.
A ocorrência com o rapaz, embora incomum, não é tão espantosa. De acordo com a veterinária Joana Ikeda, da Uerj, o animal – embora consiga abrir a boca de modo assaz avantajado – é incapaz de engolir um ser humano. Todavia, se tentasse fazê-lo, poderia se ferir e também machucar ou mesmo matar a pessoa, uma vez que, embora lhe faltem os dentes, possui mandíbulas muito fortes. O que ocorreu, no caso em foco, resume-se no seguinte: O jovem acabou sendo, por acidente, abocanhado parcialmente pela baleia quando ela tentava alimentar-se de pequenos peixes. Apenas isso (cf. Como uma pessoa pode ser engolida por uma baleia e sair ilesa?, G1, 14/02/205, on-line). Em todo caso, o fato interessa ao estudioso da Bíblia, pois relembra, como dito, o livro de Jonas.
Mais impressionante, todavia, é o caso de James Bartley, ocorrido, em fevereiro de 1891, nas ilhas Malvinas. Na ocasião, um grupo de marujos perseguia uma baleia a 5 km de distância. Eles notaram, contudo, em determinado momento, o sumiço de Bartley. Desesperados, dominaram a baleia, mataram-na e dissecaram-na. Eis que, no seu ventre, encontraram o colega vivo, porém encolhido e desmaiado. Na cabine do navio, foi, com algumas medicações, se recuperando aos poucos, mas só recobrou bem a consciência duas semanas depois. Contou que, antes de desmaiar, respirava normalmente, embora sentisse muito calor no ventre do animal (cf. Pergunte e Responderemos, n. 471, agosto de 2001, pp. 363-364). Tal fato poderia, a seu modo, contribuir para entender como Jonas teria sobrevivido no ventre do grande peixe sem que, para isso, precisássemos recorrer a um milagre. Bastaria a Divina Providência especial; ou seja, o Senhor valer-se de meios naturais com vistas a executar seu plano de amor em favor dos habitantes de Nínive.
Isto posto, cabe observar o seguinte: Exegetas católicos contemporâneos não temem afirmar que o livro de Jonas – escrito entre os séculos V e III a.C. – não é histórico. Trata-se de uma parábola, pois recorre a uma história sensível a fim de ilustrar uma verdade muito superior: a salvação de Deus é para todos. Isto como que antecipa a mensagem cristã de 1Tm 2,4. Sim, Jonas, modelo do judeu nacionalista ferrenho certo da salvação dos israelitas, mas da perdição de todos os demais seres humanos, é dobrado pelo Senhor em seu orgulho. Depois de passar por diversas peripécias encantadoras, prega penitência aos ninivitas e também eles se convertem. O amor divino não conhece limites.
Resta, entretanto, uma questão de peso: Se o livro de Jonas é uma parábola, por que Cristo o cita mais de uma vez (cf. Mt 12,40-41; Lc11,30.32)? – Respondem os estudiosos que, ao citá-lo, o Senhor Jesus não tenciona o seu aspecto histórico, mas, sim, o literário. Utiliza-o, de modo lícito, a título de instrumento apto a instruir seus ouvintes por meio de uma obra muito popular do Antigo Testamento. O mesmo se dá com Paulo (2Tm 3,8; 1Cor 10,4) e Judas (Jd 9-10.14). Eles, ao se valerem da tradição oral judaica e do apócrifo livro de Henoque, desejam muito mais extrair dali uma lição moral do que abonar a realidade histórica dos fatos aí narrados (cf. Pergunte e Responderemos n. 471, p. 367).
Em suma, o livro de Jonas – muito além da façanha do profeta que anunciou a Jeroboão II a vitória sobre seus inimigos (1Rs 14,25) e, tempos depois, foi tragado por um grande peixe – quer ensinar que a salvação de Deus é universal.
Vanderlei de Lima é eremita de Charles de Foucauld na Diocese de Limeira.
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