HUMILDADE, UM MODO DE SER MUITO SÁBIO

 

(Foto ilustrativa)

Por uma monja beneditina camaldolense

 

I

 

Bento de Núrsia viveu há quinze séculos, mas tem algo a nos dizer hoje, ao mundo contemporâneo, aos homens e mulheres de nossas sociedades múltiplas que precisam ser libertados das diversas formas contemporâneas de opressão humana.

Quando olhamos para a história do mundo e dos nossos países, percebemos que a experiência de potências, impérios que tentaram oprimir e escravizar as sociedades no passado, ainda hoje existe. A mensagem de São Bento e dos seus filhos espirituais parece-nos tão atual como sempre: “ora et labora” (reza e trabalha). São uma atitude e uma espiritualidade muito fortes que trazem consigo uma mensagem de verdadeira liberdade.

A nossa vida é condicionada por programas que nos levam a um estilo de vida baseado unicamente na economia e bem-estar, enquanto os valores humanos fundamentais desaparecem. As heranças espirituais das nações estão ameaçadas como disse o Papa João Paulo II em um discurso[1]...

São Bento é um santo de esperança, mentor de grandes mudanças no seu tempo. O seu modo de viver e propor a relação com Deus trouxe grandes avanços para a cultura e o desenvolvimento da Europa. A sua mensagem, de fato, é universal e dirigida a toda a humanidade e a todos os povos.

Entre os vários fundamentos que lançou para a sua comunidade monástica e que depois passou para as sociedades, há um grande ensinamento: o da humildade. A humildade é um modo sábio de viver, uma virtude, que Jesus quer que aprendamos com Ele: Aprendam de mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrarão refrigério para a sua vida[2] Há um lindo texto de uma audiência do Papa Francisco, onde ele compara esses imperativos que Cristo nos dá às qualidades de um líder[3]. Mas só Jesus o faz com o coração livre e desinteressado, pois tem no coração apenas a nossa felicidade e a vida plena. Jesus, como recorda a Carta aos Filipenses: Humilhou-se tornando-se obediente até à morte e à morte de cruz[4] e pediu-nos que o imitássemos, aprendêssemos dele precisamente porque quer dar-nos alívio! Nosso mundo está tão infeliz e cansado!

A humildade foi a disposição mais profunda e radical da existência de Jesus, e ser seu discípulo consiste em seguir os seus passos. Assim poderemos oferecer o nosso corpo e a nossa alma para que Deus faça a sua história em nós. Desde o início, a Igreja procurou ouvir o convite de Jesus para ser humilde como Ele o foi. A vida dos santos conta como eles colocaram em prática o exemplo de Jesus. Para a espiritualidade cristã, de fato, a humildade constitui um caminho privilegiado para a experiência de Deus.

A humildade para São Bento consiste em “configurar-se com Cristo”, em fazer a vontade do Pai e não a própria. Na sua Regra, encontramos diversas referências a esta virtude, mas o capítulo 7 é inteiramente dedicado a ela. A ideia de São Bento é apresentar o caminho da humildade como uma escada com a qual se ascende à união com Deus através de 12 degraus. É uma espécie de “escada da vida” que se sobe por amor de Cristo. Partimos do temor de Deus (nunca se esquecer dele) e, através do relacionamento correto com os outros e depois conosco mesmos, chegamos ao amor de Deus:

Quando o monge houver subido todos esses degraus da humildade, chegará em breve a essa caridade de Deus, que, sendo perfeita, expulsa o temor, e, graças a ela, tudo o que antes observava com sentimento de terror, observará de então em diante sem esforço algum, como que naturalmente e por hábito adquirido [...], por amor a Cristo, pelo bom costume e pelo deleite próprio das virtudes[5].

É assim que uma prática, que primeiro deve ser empreendida e exercida com fé, torna-se, depois, uma bela qualidade da pessoa, formando hábitos bons e saborosos numa vida plena e bela.

Os degraus individuais estão interligados; partindo do relacionamento com Deus, passamos para o relacionamento com o outro, aprendendo a lidar com ele e seus defeitos e a aceitá-los com paciência. É uma jornada extremamente necessária para nossas famílias, nos nossos locais de trabalho, nas nossas comunidades e sociedades. Ao praticar a humildade com constância, percebemos que o nosso ambiente começa a mudar para melhor. Porque as grandes mudanças no mundo começam conosco: contigo e comigo, com os nossos pequenos gestos. Santa Madre Teresa de Calcutá costumava dizer: “Se você quer mudar o mundo, vá para a casa e ame sua família”.

Em nossos tempos, a humildade não é um valor positivo; é considerada uma fraqueza porque conta quem é forte, arrogante, orgulhoso, autoritário e quem grita mais alto sem conhecer seus limites.

Hoje, não queremos nos mostrar humildes e por isso nem expressamos isso com a língua. No passado havia uma competição, sobretudo entre os religiosos para ser humilde ou melhor dizendo, para parecer humilde por fora, e nos impúnhamos a mais variadas humilhações e mortificações para sermos vistos como mais humildes que os outros – mas quanto orgulho havia por trás só Deus sabe...

 

II

 

A humildade é realmente útil? É agradável? É necessária? Em 22 de maio de 2024, o Papa Francisco dedicou uma audiência à humildade, chamando-a de “base da vida cristã”. Dizia: «Humildade é tudo. É o que nos salva do Maligno e do perigo de nos tornarmos seus cúmplices. É a fonte da paz no mundo e na Igreja. Onde não há humildade, há guerra, discórdia, divisão. Deus nos deu o exemplo disso em Jesus e Maria».

Ele nos lembrou a verdade fundamental da nossa frágil humanidade que vem do pó, realidade que celebramos na liturgia da Quarta-feira de Cinzas: Então o Senhor Deus formou o homem do pó da terra e soprou em suas narinas o fôlego de vida, e o homem tornou-se um ser vivente[6]. Esta é a nossa condição de criaturas que a Bíblia nos recorda desde o início: somos pó e ao pó voltaremos[7]. A palavra “humilde” deriva, de fato, do latim humus, isto é, terra.

A Palavra de Deus nos permite conhecer os pensamentos de Deus, seus planos e seus caminhos. São muitos os textos bíblicos que refletem a importância da humildade no relacionamento com Deus e com os outros, e mostram como a humildade é uma qualidade apreciada e abençoada por Deus. Pode-se fazer uma pequena antologia e se surpreender com a riqueza da vida de quem decide seguir o caminho da humildade.

Um dos primeiros personagens que a Bíblia nos apresenta é Moisés. Ele é um grande libertador, legislador e profeta. É considerado o mediador da aliança entre Deus e o povo de Israel e o tradicional autor do Pentateuco (os primeiros cinco livros da Bíblia). Sua vida é um exemplo de fé e humildade. Apesar de sua posição de liderança, Moisés é frequentemente descrito como um homem muito humilde. No livro dos Números é dito que Moisés era muito mais humilde do que qualquer outro sobre a terra[8]. Ele era um homem tão humilde que podia ser AMIGO DE DEUS: O Senhor falava com Moisés face a face, como um homem fala com seu amigo[9].

Depois, há o exemplo de Davi que, mesmo tendo-se tornado rei, manteve uma atitude de humildade diante de Deus. Nos salmos, muitas vezes expressa o seu arrependimento e o seu reconhecimento da grandeza de Deus em comparação com a sua própria insignificância. Também conhecemos Jó: Jó é conhecido por sua paciência e humildade. Apesar de grande sofrimento, ele mantém a fé e a humildade, reconhecendo a soberania de Deus.

Há Maria, Mãe de Jesus, a mais humilde de todas as criaturas, cuja humildade não cansamos de meditar. Ela era tão pequena que atrai a atenção de Deus e é escolhida para ser a mãe de Jesus. Todo o seu segredo, o seu grande mistério e a sua maravilha excelente estão contidos nesta única palavra: HUMILDADE. Ela conhecia profundamente a verdade das palavras que canta. Tinha consciência do seu nada e da imensa misericórdia de Deus:

 

Então Maria disse: «A minha alma engrandece ao Senhor

e meu espírito se alegra em Deus, meu salvador,

porque ele olhou para a humildade de sua serva.

De agora em diante todas as gerações me chamarão de bem-aventurada.

O Todo-Poderoso fez por mim grandes coisas

e Santo é o seu nome!»[10]

 

            Há João Batista. João Batista mostrou humildade ao reconhecer a superioridade de Jesus, dizendo: Não sou digno de desamarrar as correias de suas sandálias[11]. E Paulo de Tarso, mesmo sendo apóstolo e tendo um papel importante na difusão do cristianismo, muitas vezes, demonstra humildade. Em 1Coríntios 15,9 ele diz: Porque eu sou o menor dos apóstolos e não sou digno de ser chamado apóstolo, porque persegui a Igreja de Deus.

Muitos personagens nas Sagradas Escrituras demonstram que a humildade é uma virtude central na fé bíblica, exemplificada tanto em momentos de grande sucesso quanto em momentos de dificuldade. Mas o modelo, a humildade encarnada, é Jesus Cristo, Filho de Deus, que não considerou um privilégio ser como Deus, mas esvaziou-se assumindo a condição de servo, tornando-se semelhante aos homens. Pela aparência reconhecida como homem, humilhou-se tornando-se obediente até à morte e morte de cruz. Por isso Deus o exaltou e lhe deu o nome que está acima de todo nome...[12]

Não podemos deixar de pensar no quarto canto do Servo do Sofredor, de que fala Isaías[13] e que é atribuído à paixão e morte de Cristo:

 

Quantos ficaram maravilhados com ele [...]

a sua aparência era tão desfigurada para um homem

e o seu aspecto não era mais o de um homem […]

Desprezado e rejeitado pelos homens,

homem de dores que conhece bem o sofrimento,

como alguém de quem se esconde o rosto,

ele era desprezado e não tínhamos respeito por ele […]

Maltratado, ele se deixou humilhar

e não abriu a boca;

ele era como um cordeiro levado ao matadouro,

como uma ovelha que fica muda diante dos seus tosquiadores,

e ele não abriu a boca.

 

Estas palavras perfuram o nosso coração e dão-nos a chave para compreender toda a questão da humildade, porque sem referência a Cristo todo o caminho da humildade é inútil. Cristo não é apenas o modelo da nossa vida, mas também a fonte da graça que recebemos ao sermos imersos na Sua morte. O próprio Jesus nos convida: Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis revigoramento para a vossa vida[14].

A humildade, se praticada, nos convence de que nos faz bem, de que somos mais felizes. Existem numerosos salmos com os quais se pode pedir ao Senhor esta grande graça. O Salmo 119 é particularmente belo, e a sua construção é verdadeiramente uma obra-prima. São 22 estrofes com 8 versículos cada uma, compostas segundo a ordem do alfabeto hebraico. Cada versículo de uma dada estrofe se inicia com a mesma letra. No versículo 71[15] lemos: É bom para mim, se fui humilhado porque assim aprenderei a tua lei. Este versículo é encontrado na nona estrofe do salmo, que inicia todos os versículos com a nona letra do alfabeto hebraico: TET (T em português). A palavra mais importante que começa com a letra TET é TOB que quer dizer bem, bom, belo, a perfeição do ser. Esta raiz ressoa seis vezes na estrofe, quase como uma nota dominante.

O salmista afirma que a bondade de Deus deve ser descoberta mesmo nas trevas da provação. Tudo é bondade, tudo é bom. Podemos dizer que tudo é graça. A palavra do Senhor traz apenas o bem, a alegria, a paz e está presente na vida com a sua eficácia salvadora e libertadora[16]. O salmista afirma que Deus é bom mesmo quando nos deixa ser tentados e parece calar-se. A dor é aproveitada como educação paterna de Deus e é também uma misteriosa Palavra de Deus. Este bem é confirmado nas consequências da humilhação: aprenderei a tua lei. A única lei que o Senhor quer nos ensinar é a lei do amor!

 

Escuta, Israel: o Senhor é o nosso Deus, o Senhor é o único. Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com todo o teu ser e com todas as tuas forças. Que estes preceitos que hoje te dou permaneçam fixos em teu coração; tu os repetirás para teus filhos, falarás deles quando estiveres sentado em casa, quando caminhares pelo caminho, quando te deitares e quando te levantares[17].

III

 

Santo Agostinho dedicou um de seus discursos à humildade[18] comentando as palavras do Evangelho de Mateus: Vinde a mim, todos vós que estais cansados e oprimidos[19] Neste discurso, há uma afirmação maravilhosa, que sem humildade não há santidade: “quer ser grande? Comece sendo pequeno. Quer erguer um edifício que alcance o céu? Primeiro construa a base da humildade.”

Na vida cristã, toda virtude, toda boa obra não vale nada sem humildade. No cristianismo, a humildade é considerada uma virtude fundamental que dá valor a tudo o mais e é considerada uma qualidade necessária para a santidade. Os santos não são santos porque fizeram grandes coisas, porque fizeram milagres, porque foram capazes de jejuar ou de comover com suas pregações... Tudo isso sem humildade não é nada. Santos são santos porque são humildes.

A humildade abre-nos à verdade do nosso coração, ajuda-nos a compreender a nossa própria fraqueza e imperfeição e, assim, nos faz converter-nos. É a humildade que nos ajuda a admitir que precisamos da misericórdia e da graça de Deus. A humildade nos faz reconhecer que dependemos de Deus em tudo. Os santos expressaram muitas vezes, e viveram verdadeiramente, a sua total dependência de Deus, da sua vontade e do seu poder em todos os seus projetos e empreendimentos, demonstrando grande confiança no Senhor e disponibilidade para cumprir a sua vontade.

A humildade nos ajuda a tratar os outros com estima, respeito e caridade, considerando sua dignidade e grande valor. Os santos são conhecidos por seu amor pelos outros e por sua capacidade de extrair o que há de melhor nos outros. A humildade torna possível tudo o que é impossível: ajuda-nos a ser obedientes à vontade de Deus, mesmo que isso pareça muito difícil.

A humildade é contrária ao orgulho, que é um dos pecados mortais e um grande obstáculo no caminho da santidade. O orgulho leva à vangloria e separa a pessoa de Deus e dos outros. Os santos, como todos, são pecadores, pessoas limitadas e com imperfeições, mas é sempre a humildade que os faz viver tudo com alegria e confiança incondicional em Deus.

Os santos, que foram modelos de vida cristã, apesar da sua fragilidade, sublinharam, muitas vezes, o grande significado e importância da humildade na vida espiritual ensinando como vivê-la verdadeiramente. Na verdade, é muito fácil praticar uma humildade falsa e prejudicial. Santo Agostinho, por exemplo, fala de uma “falsa humildade que é um grande orgulho”[20], pois aspira à glória.

São Tomás na Summa Theologica diz que o orgulho pode destruir qualquer mérito, já que se pode orgulhar das próprias virtudes. Ele chama de orgulho o amor desordenado pela própria excelência, e escreve longamente sobre as várias maneiras pelas quais procuramos exaltar a nossa excelência. Destaca ainda, que o orgulho não busca a excelência apenas nas realidades sensíveis, mas também nas espirituais e inteligíveis.

Um outro aspecto muito interessante é a explicação que São Tomás dá ao comentar as palavras de São Paulo: Aspirar aos maiores carismas[21]. Diz que esforçar-se por grandes coisas confiando nas próprias forças é contra a humildade, mas não é contra a humildade tender a elas confiando na ajuda de Deus, especialmente se pensamos que o ser humano torna-se próximo de Deus quanto mais aceita e realiza a sua vontade (cf. Mt 23,12; Lucas 14,11). Na mesma linha, Santo Agostinho [l. cit.] já havia dito que uma coisa é elevar-se a Deus e outra coisa é elevar-se contra Deus. A humildade, como foi dito, consiste especialmente na dependência do ser humano de Deus.

É humilde quem ama o próximo, estimando-o pelo que é. Quem sabe reconhecer o bem nos outros e se alegrar com o seu bem, nem é preciso dizê-lo porque isso se vê em tudo o que ele faz, como diz São Tomás. São Gregório Magno afirmava que o orgulho transparece em todo o corpo[22]. É muito simples verificar se realmente aprecio e respeito os outros, basta ver como falo com os outros, como falo dos outros. O fariseu do templo agradecia a Deus, voltava-se para Deus, mas, na forma como o fazia, queria apenas realçar a sua própria excelência.

Expressamos o que somos externamente, mesmo que não tenhamos consciência disso, porque o expressamos com todo o nosso corpo, com a linguagem não verbal: o nosso corpo fala com os gestos, com a postura, com o nosso olhar, com as expressões faciais, com o tom de voz. Expressamos, tanto o que temos consciência quanto o que não temos consciência.

Tudo isso revela se realmente acreditamos em nossos corações que o nosso próximo é uma pessoa especial. E se estamos dispostos a viver no caminho de Cristo que não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pelos outros. A “morte espiritual” de si mesmo para o bem dos outros tem a sua força no exemplo e na graça de Cristo. Não se trata de mortificar-se, de desprezar-se, mas de amor pelo outro.

São Tomás explica que ser humilde nas relações com os outros evita fazer o mal às pessoas que estão ao nosso lado. O humilde não prejudica ninguém. Diz que a humildade, como todas as outras virtudes, vem da alma. Ressalta ainda que submeter-nos aos outros[23] pode dar ocasião para estes se sentirem orgulhosos ou nos desprezarem. Porém, se alguém faz o que deve fazer e os outros se aproveitam da sua atitude, isso não deve ser atribuído a quem se comporta com humildade, pois não erra, embora os outros tomem sua atitude como ocasião para errar.

Uma de nossas irmãs, Ir. Nazarena escreveu uma vez:

É difícil dizer se a humildade é verdadeiramente genuína, porque é muito fácil fingi-la. Um bom teste é este: estudar-se com lealdade para ver nossa reação interna e externa às humilhações e elogios. Se alguém sente prazer em ouvir-se elogiar, ver-se aplaudido e coisas semelhantes, quanto mais prazer sentir em tais casos, mais longe estará da verdadeira e pura humildade. Se permanecer indiferente ao elogio, se não o desejar, se realmente tentar escapar dele, então é uma boa indicação de que é uma humildade não fingida. Pelo contrário, se diante das humilhações, dos fracassos, das calúnias, dos esquecimentos e do desprezo dos outros, a alma fica abatida, entristecida, rebela-se, tenta fugir –, humildade?... Se em vez disso, acolhe estas circunstâncias adversas com espírito sereno e calmo – então, sem se enganar, pode-se dizer que tal pessoa deve estar bem avançada no caminho divino.

Aceitar que somos precários, que precisamos dos outros e que somos imperfeitos num mundo imperfeito pode nos entristecer. Por isso, com as nossas fantasias e as nossas esperanças, nos defendemos de tal realidade. Mas é precisamente compreendendo e aceitando as nossas fraquezas que nos tornamos plenamente humanos. Esta é a realidade, uma base sólida e verdadeira sobre a qual podemos nos conectar com outras pessoas. Nos sentimos bem junto com pessoas humildes, porque elas têm aquela descontração e ironia que só a humildade pode dar.

Quem tem consciência de seus pontos fortes e limitações não tenta mostrar o quanto é bom. Muitas pessoas estão sempre tentando mostrar que são melhores que as outras. Elas querem prevalecer e só isso lhes dá uma razão para viver. Elas não estão satisfeitas em ser o que são, têm que ser melhores que todos. Mas como estão envolvidas nesta competição, têm menos energia para o que realmente importa e a ansiedade de vencer as distrai do que têm de fazer e tira-lhes o prazer.

A humildade é o oposto. Consiste em não estar programado para triunfar. Uma pessoa humilde não precisa vencer para justificar a sua existência. Ela sabe muito bem que outros podem ser melhores que ela. Porque sempre há alguém melhor que ela em alguma coisa. E ela aceita. Este fato elementar tem enormes consequências. Se não tento ser o que não sou, posso me permitir ser o que sou. Como dizia São Francisco: “o que vale um homem diante de Deus, é o tanto que vale e nada mais...”. O humilde se conhece e não se esforça por ser o que não é... E aqui reside a sua beleza: ele abraça a vida como ela é e a ama como ela é; nada mais nada menos. Tem sempre diante de si o que ele é: pobre criatura amada por Deus.



[1] Cfr. O Discurso de João Paulo II durante a visita ao SACRO SPECO 28 de setembro de 1980.

[2] Mt 11,29.

[3] PAPA FRANCISCO Audiência Geral, Praça São Pedro, quarta-feira, 14 de setembro de 2016.

[4] Fil 2,8.

[5] cfr. São Bento de Norcia Regra, capítulo 7, 67-69.

[6] Gen 2,7.

[7] Gen 3,19.

[8] Num 12,3.

[9] Ex 33,11.

[10] Lc 1,46.

[11] Jo 1,27.

[12] Fl 2,5-9.

[13] Is 52, 13- 53,7.

[14] Mt 11,29.

[15] Sl 119,71.

[16] Cfr. Gianfranco Ravasi, Il Libro dei Salmi commento e attualizzazione, vol. III, Bologna, EDB 1984.

[17] Dt 6,4-7.

[18] Santo Agostinho, Discurso 69.

[19] Mt 11, 28-30.

[20] Santo Agostinho Epist. 149

[21] 1Cor 12, 31

[22] Moralia 34, 22

[23] São Tomás chama humildade o colocar-se em posição inferior a um outro que é menos inteligente ou menos bom. Segundo São Tomás em cada pessoa existem duas realidades: aquilo que pertence a Deus e o que pertence ao humano. Ao humano pertencem os defeitos, a Deus pertencem tudo aquilo que vale para a nossa realização e os dons que cada um de nós recebeu de Deus. Assim podemos sempre nos maravilhar e reverenciar, colocando-se numa posição inferior diante daquilo que no outro é um dom que ele recebeu de Deus.

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