EUCARISTIA: SUBIR ATÉ DEUS E DESCER ATÉ OS POBRES
A
primeira semana de junho foi uma das mais ricas – liturgicamente – do meu
sacerdócio. Como parte do “Renascimento Eucarístico Nacional”, a peregrinação
mariana percorreu minha diocese a caminho de Indianápolis. Percorremos, com o
Santíssimo Sacramento, as ruas de Rochester e Minnesota; depois, celebrei uma
grandiosa e festiva Missa no Centro Cívico da cidade. Poucos dias depois,
celebrei uma Missa na cidade de La Crescent, que fica exatamente à margem de
Minnesota, do rio Mississippi; e, a seguir, peregrinei, com a Eucaristia, na
companhia de cerca de três mil pessoas, para La Crosse, na margem do Wisconsin.
No
final da procissão, entreguei o ostensório ao meu colega Gerard Battersby,
bispo de La Crosse, e celebramos juntos a missa para a multidão reunida no Centro
Cívico de La Crosse. Todos estes serviços de oração e liturgias eucarísticas se
caracterizaram pelos cânticos, sinos, incenso que saía dos incensários,
paramentos suntuosos e ladainhas em abundância. No dia seguinte ao da missa de
La Crosse, tive o privilégio de ordenar sacerdotes três jovens na minha diocese
de Winona-Rochester. A liturgia da ordenação, uma das mais belas do repertório
da Igreja, incluiu – além de tudo o que
acabo de mencionar – a unção das mãos dos recém-ordenados, uma recepção formal
por parte de todos os sacerdotes presentes e uma cerimônia de investidura.
Tudo
isso foi maravilhoso. Tudo isso, tenho a certeza, elevou os corações e as almas
dos que o vivenciaram. Na mente de alguns, porém, este tipo de grande espetáculo
litúrgico suscita uma questão, até mesmo uma crítica: O que isso tem a ver com
o trabalho da Igreja de atender aos doentes e necessitados? O que tudo isso tem
a ver com Jesus, que percorria, vestido com simplicidade, os caminhos poeirentos
da Galileia e estendia a mão aos pobres? Será que a preocupação com a música,
os ornamentos, as procissões, as ladainhas etc., equivale a uma espécie de esteticismo incontestável, a uma
fixação pelas tontices litúrgicas? Com efeito, não ouvimos exatamente esta
crítica de sacerdotes mais velhos aos mais jovens?
Permitam-me
dizer que, na medida em que é correta, esta preocupação é válida, porque a
Igreja, como nos recordou Joseph Ratzinger, faz três coisas: com efeito, adora a
Deus, mas também evangeliza e serve os pobres. E o gênio particular da Igreja
manifesta-se quando consegue manter estas três tarefas em equilíbrio, cada uma
corrigindo as outras e cada uma conduzindo às outras. Se me permitem, para
efeitos deste artigo, centrar-me na primeira e na última destas
responsabilidades essenciais, o culto a Deus deve conduzir ao cuidado dos
pobres, e o cuidado dos pobres deve conduzir ao culto a Deus, e isto por uma simples
razão. O culto consiste em centrarmo-nos em Deus, assegurando, com gestos,
palavras, cânticos, procissões etc., que Deus é a preocupação central e última
de nossas vidas. Mas quanto mais amamos a Deus, mais amamos aqueles que Deus
ama; e quanto mais amamos aqueles que Deus ama, mais amamos Aquele que os fez
amáveis em primeiro lugar. Por isso, São João nos fala que aquele que diz que
ama a Deus, mas odeia o seu próximo é um mentiroso, e, por essa razão, o
próprio Senhor insistiu que há dois mandamentos indispensáveis: o amor a Deus e
o amor aos irmãos. Gostaria de expressar isto como um princípio: quanto mais se
sobe liturgicamente, mais se deve descer no serviço aos pobres; e quanto mais
se desce no serviço aos pobres, mais alto se deve ir liturgicamente. O perigo é
uma ênfase unilateral na liturgia ou uma ênfase unilateral no serviço, a
primeira conduz à irritação e a segunda reduz a Igreja a uma organização de
serviço social.
Há
tantas grandes figuras na história recente da Igreja que encarnaram meu
princípio nas suas vidas e no seu trabalho. Alguém poderia pensar em Dorothy
Day, a fundadora do Movimento do Trabalhador Católico. Não houve ninguém na
Igreja do século XX mais dedicado a servir os pobres e os famintos e a lutar
contra a injustiça social do que Dorothy Day e, no entanto, sua devoção à
oração, à bênção, ao rosário, aos frequentes retiros espirituais e, claro, ao
Santíssimo Sacramento era irrestrita. Madre Teresa de Calcutá foi um ícone de
serviço durante o seu longo ministério entre os mais pobres dos pobres. Nenhum
católico do século XX teve um compromisso mais encarnado com o sofrimento e se
identificou mais com ele do que Madre Teresa e, no entanto, seu amor pela
oração era ilimitado, sua atenção à Eucaristia insuperável. E, se voltarmos ao
início, podemos chamar a atenção sobre Virgil Michel, Reynold Hillenbrand e
Romano Guardini, todos eles estandartes do Movimento Litúrgico que tanto
influenciou no Vaticano II. Cada um destes senhores sustentava que o que
acontece na Missa, no seu esplendor, deveria se derramar pelas ruas como
devoção aos membros sofredores do Corpo Místico de Cristo. Como me contaram
sacerdotes mais antigos de Chicago, quando eu era recém-ordenado, o bispo
Hillenbrand convidou Dorothy Day ao Seminário de Mundelein para sublinhar
precisamente esta relação.
Um dos tristes acontecimentos dos anos posteriores ao Vaticano II é o desmoronamento do que, uma vez, foi unidade. Agora, os “liberais” tendem a ser os que se preocupam com os pobres e os “conservadores” os que se preocupam com a liturgia. Mas isto é estúpido e perigoso para a Igreja. Quanto mais se é um, mais se deve ser o outro, e vice-versa. Por isso, uma vez mais, gostaria de repetir o meu adágio: quanto mais se sobe liturgicamente, mais se deve descer no serviço aos pobres; e quanto mais se desce no serviço aos pobres, mais alto se deve ir liturgicamente.
Dom Robert Barron, bispo de
Winona-Rochester, doutor em Teologia e escritor
[Tradução: Vanderlei de Lima / Revisão: Thamara Rissoni].
https://es.zenit.org/2024/06/17/cuanto-mas-se-sube-liturgicamente-mas-se-baja-en-el-servicio-a-los-pobres-por-bishop-barron/?eti=15434
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