CRESCENTE OPOSIÇÃO AO "TRATAMENTO EXPERIMENTAL" TRANS NA EUROPA

 

Sofie Crommen, psiquiatra de crianças e adolescentes e uma das signatárias do Documento

J.M.C. 06/05/2024, Religión en Libertad

Cresce a corrente contra os “tratamentos experimentais” trans: psiquiatras europeus se unem.

Algo está mudando na Europa no que diz respeito às chamadas “terapias de afirmação” transexual, aquelas cujo tratamento ante a disforia é apenas o da mudança de sexo, em vez de abordar os traumas ou doenças causadoras.

Não faz nem um mês que o Serviço Nacional de Saúde britânico – NHS, nas suas siglas em inglês – confirmou o início da restrição à medicação administrada a menores para tratamento transgêneros.

A origem desta decisão histórica está no emblemático Relatório Cass, liderado pela ex presidente do Royal College of Paediatrics [Real Colégio de Pediatras], Hilary Cass, que revelou como o Serviço de Desenvolvimento da Identidade de Gênero britânico teria obrigado milhares de jovens e adolescentes a embarcarem em um “caminho tortuoso e desnecessário, permanente e que lhes mudará a vida [...] um modelo de tratamento que os expõe a um risco considerável de sofrimento mental e que não é uma opção segura nem viável a longo prazo”.

Ressaltando a falta de garantias que justifiquem os benefícios destes tratamentos para os pacientes, bem como a sua falta de segurança e as preocupações com os danos a longo prazo, o relatório conseguiu a suspensão dos tratamentos na Inglaterra, tornando-a o quarto país europeu a tomar essa decisão. 

Os antecedentes dos países nórdicos contra os bloqueadores

Um dos países pioneiros na hora de enfrentar os tratamentos de afirmação transexual foi a Finlândia, que, em 2020, decretou que a psicoterapia, e não os bloqueadores da puberdade ou o uso de hormônios cruzados[1] deviam ser os principais tratamentos na abordagem terapêutica. Além disso, as autoridades finlandesas priorizavam a necessidade de se elaborar um diagnóstico prévio que corroborasse a inexistência de perturbações ou condições mentais antes de iniciar o procedimento médico.

Em fevereiro de 2023, a Suécia fazia o mesmo por meio do seu responsável sanitário, Thomas Linden, ao reconhecer que “o estado incerto de conhecimento sobre o assunto (dos tratamentos de mudança de sexo) convida à prudência”. Assim, a Suécia passou de pioneira a detratora dos tratamentos para transgêneros, quando o déficit  de atenção, o autismo, os problemas alimentares, os suicídios e uma série de perturbações e efeitos associados a este tipo de tratamento foram definitivamente abordados pelas autoridades que cederam ante tal afirmação.

Em junho de 2023, a Noruega se juntava à corrente opositora aos tratamentos experimentais transgêneros por meio do apelo da Junta de Pesquisa de Cuidado Médico para rever suas pautas a respeito. O motivo principal foi, mais uma vez, a ausência de evidência científica, o que a levou a decretar que esses tratamentos fossem “relegados ao âmbito experimental”. “A base de conhecimento, especialmente a fundamentada na investigação para o tratamento da afirmação de gênero (hormonal e cirúrgico), é deficiente e os efeitos, a longo prazo, são pouco conhecidos. Isto é particularmente certo para a população adolescente, na qual tampouco se conhece a estabilidade da incongruência de gênero”, argumenta o relatório da agência.

Declaração conjunta de psiquiatras europeus

Nos últimos dias, a Sociedade Europeia de Psiquiatria da Infância e da Adolescência (ESCAP) publicou uma declaração conjunta com assinaturas de psiquiatras do gabarito de Sofie Crommen, Maja Drobnič Radobuljac, do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Ljubljana (Eslovênia), ou da pesquisadora e psiquiatra-chefe do Hospital Universitário de Tampere (Finlândia), Riittakerttu Kaltiala, entre outros.

Em sua declaração, o próprio título faz referência à “necessidade urgente de salvaguardar as normas” nos tratamentos de pacientes com disforia: neste sentido, os pesquisadores advertem que, embora, no papel, a disforia de gênero possa não ser “um transtorno de saúde mental” para a Organização Mundial de Saúde, não é raro que a própria condição de disforia venha “acompanhada de um sofrimento significativo” e tenha “um impacto psicossocial importante no indivíduo e na família, exigindo, às vezes, intervenções médicas e psicossociais”.

O documento chama a atenção para as graves alterações em torno da disforia de gênero que levaram a não poucos médicos especialistas na área psiquiátrica a considerá-la “uma moda”.

De acordo com a declaração conjunta da ESCAP, os primeiros serviços especializados deste tipo se destinavam a “um pequeno número de adultos” que eram biologicamente homens e se definiam como mulheres. Atualmente, prossegue o documento, assiste-se a um “aumento substancial” das taxas de referenciação, moldadas por um perfil totalmente diferente: “A maior parte se refere a pessoas pós-púberes” do sexo feminino. Quer dizer, em duas décadas, o perfil médio da disforia passou de masculino e minoritário a feminino, infantil e massivo: segundo os dados fornecidos pela clínica Tavistock, recolhidos no Relatório Cass, o aumento do número de meninas jovens encaminhadas para a unidade de “tratamento de gênero”, entre 2009 e 2018, passou de 32 para 1740, o que supõe um aumento de 5337%.

Em sua Declaração, a Sociedade Europeia de Psiquiatria da Infância e da Adolescência continua argumentando que, entre estes casos, há uma série de “condições comuns” que antecedem o aparecimento dessa disforia, entre elas se destacam o autismo, a depressão, a ansiedade, as tendências suicidas ou a experiência de traumas anteriores, como o abuso sexual. Condições que, como expostas, nem sempre são abordadas nos tratamentos transgêneros. 

Contra os princípios bioéticos: das “cobaias” ao suicídio

Ante o surgimento de pesquisas que evidenciam as graves consequências para a saúde dos menores, a envolverem o uso de bloqueadores hormonais e hormônios cruzados, os signatários recordam às autoridades e aos prestadores de cuidados médicos as aplicações concretas dos princípios bioéticos gerais no tratamento de menores com disforia.

Deste modo, no que diz respeito ao princípio da não maleficência, sugerem os danos de se “utilizar de uma intervenção experimental com efeitos potencialmente irreversíveis ou consequências desconhecidas”, geralmente ignorados. Recomendam também “considerar a relação benefícios-danos de não proporcionar intervenções médicas ou de garantir um diagnóstico e tratamento adequados dos transtornos psiquiátricos coexistentes”, seguindo o princípio da beneficência, e apelam para o respeito ao princípio da autonomia, “envolvendo os menores através da avaliação da sua capacidade de dar o consentimento” ou a “adoptar um processo de consentimento informado adequado para decisões possivelmente irreversíveis”. Entre outros aspectos negligenciados no estabilshment da mudança de sexo, os psiquiatras europeus também apelam para a necessidade de respeitar o princípio da justiça, garantindo o acesso a informações, avaliação e tratamentos confiáveis e atualizados.

Além dos princípios bioéticos, geralmente desrespeitados, como ficou demonstrado no caso Tavistock, os signatários enfatizam que as revisões do National Institute for Health and Care Excellence contemplam resultados prejudiciais após os tratamentos, como depressão, ira, ansiedade, alterações na densidade óssea ou suicídio. Estas revisões, na intenção de buscar a segurança dos pacientes, “recomendam evidenciar a precaução ao levar adiante tais intervenções”.

Os signatários e os psiquiatras europeus recolhem os alertas de revisões científicas alemãs a recomendarem que crianças e adolescentes com disforia “recebam prioritariamente intervenções psicoterapêuticas” que, longe de agravá-la, “abordem e reduzam” o seu peso.

“Qualquer decisão de utilizar bloqueadores da puberdade e/ou hormônios cruzados deve se avaliar caso a caso. Deve ser efetuada uma avaliação do risco-benefício e, se possível, no âmbito de estudos clínicos, deve se realizar um diagnóstico e tratamento psiquiátrico/psicoterapêutico dos transtornos mentais concomitantes”, acrescenta o relatório.

Apelos concretos aos profissionais da saúde

Antes de concluir, os signatários da Sociedade Europeia de Psiquiatria da Infância e da Adolescência lançam um último apelo aos profissionais que trabalham com pacientes com disforia de gênero para:

- Insistir em continuar um debate profissional aberto sobre a disforia de gênero em crianças e adolescentes e informar abertamente os resultados das investigações.

- Insistir para que as intervenções novas e experimentais relacionadas com a disforia de gênero sejam diferenciadas do tratamento clínico de rotina e sejam realizadas exclusivamente como parte de protocolos de ensaios de investigação.

- Informar e recordar sobre a necessidade de estudos de acompanhamento a longo prazo. A ESCAP pede à União Europeia que crie um mapa ou registo de estudos que inclua os pacientes atualmente tratados, os que não recebem tratamento e os que interromperam o tratamento, a fim de compreender melhor os resultados.

- Promover a aprendizagem ativa com os fracassos do passado na gestão de crianças e adolescentes com disforia de gênero para evitar violações das normas clínicas, científicas e éticas existentes.

- Insistir na atenção explícita às pessoas que buscam a destransição[2] ou lamentam sua transição, para abordar, respeitar e compreender as suas experiências, oferecer atenção e apoio adequados e considerar como estas narrativas podem ser integradas na prática clínica.

- Impulsionar um debate profissional aberto, inclusivo e baseado em evidências sobre o desenvolvimento de normas para melhor atenção a crianças e adolescentes com disforia de gênero. Este debate e qualquer processo de tomada de decisão devem incluir peritos com experiência vivida em incongruência de gênero com resultados diversos (transição, destransição, resolução sem intervenções e qualquer outro resultado possível).

- Insistir para que os resultados da investigação sejam publicados exclusivamente com base em critérios de qualidade e não em função de suas conclusões.

Os signatários concluem o documento não sem antes reiterar as “graves consequências, a longo prazo, destes tratamentos”, enfatizando a necessidade de um acompanhamento a longo prazo que permita compreender tanto “a evolução natural da disforia sem tratamento médico” como as consequências da transição. A ESCAP conclui apelando aos prestadores de cuidados médicos para que “não promovam tratamentos experimentais e desnecessariamente invasivos com efeitos psicossociais não comprovados e, por conseguinte, deem adesão ao princípio primum-nil-nocere (primeiro, não causar dano)”.



[1] Prescreve-se hormônio masculino para meninas (que se sentem meninos) e hormônio feminino para meninos (que se sentem meninas) – NT.

[2] Neologismo encontrado pelo tradutor brasileiro para demonstrar o desejo que alguns transexuais têm de “desfazerem” sua cirurgia de transição ou de mudança de sexo – NT.

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