O DIREITO A SERVIÇO DAS PESSOAS DE BEM



(Para entender a legítima defesa, a excludente de ilicitude e o estado de necessidade)


Vanderlei de Lima, graduado em Filosofia com Extensão em Direito e Punição, pela PUC-Campinas, SP[1].


O Assunto: O Código Penal, artigo 25, define a legítima defesa e as condições para que ela ocorra. O cidadão de bem pode (e deve) valer-se desse artifício legal para repelir – inclusive por meio de armas, se for o caso –, injustos agressores seus, de terceiros ou de sua legítima propriedade. A instalação de ofendicula (ofendículos) é também um meio legal de impedir furtos e/ou roubos de seus bens. Cabe ainda, antes, uma palavra sobre a excludente de ilicitude e o estado de necessidade, tratados nos artigos 23 e 24 do mesmo Código, respectivamente. Analisemos, portanto, de modo genérico, a temática.

***

1. Poderia citar, na Lei, a excludente de ilicitude?

Sim. O Decreto Lei n. 2.848, de 07 de Dezembro de 1940, assim diz em seu Art. 23 – “Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Excesso punível: Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo”.

2. Como interpretar a expressão “não há crime”?

A expressão “não há crime” é muito clara: “não existe crime algum”[2] quando o agente (a pessoa) que, de si praticaria – em outras circunstâncias – um delito, nessas situações, não o pratica. Ao contrário, age legalmente, pois está amparado pela Lei.

3. Quais os três casos elencados?

Os três casos são: “I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”. Tratemos de cada um.

4. Que é estado de necessidade?

Diz o Código Penal Art24 “- Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”.
“§ 1 º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).”
“§ 2 º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).”

5. Poderia dar um exemplo simples e entendível após transcrever o caput?

Art24 “- Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”.
Sim. No “estado de necessidade” há sempre dois bens jurídicos à vista. Tem de se pesar qual o de maior valor objetivo ou universal. Vamos por partes.
Há dois bens jurídicos em jogo: um é a vida de uma criança indo à escola e outro é a de um cachorro rottweiler de estimação que está na rua, após ter escapado de uma propriedade por descuido de seu dono. Um morador próximo, com uma foice nas mãos, vem em socorro da criança em pânico e, com dois golpes de foice, detém o animal e salva a criança. Dias depois, o cachorro morre em decorrência da agressão. Que dizer?
O “homem da foice” agiu em “estado de necessidade”, pois a) estava diante da vida de um ser humano indefeso (bem de maior valor jurídico) e da de um bicho feroz (bem de menor valor jurídico); b) praticou o fato para salvar alguém de perigo atual; c) não praticado por sua vontade (o cão não era dele e nem era de sua responsabilidade a manutenção do bicho preso); d) não havia outro modo para salvar a criança do ataque do grande animal a não ser este; e) agiu em direito alheio (da criança) e f) pois seria absurdo exigir o sacrifício da integridade física da criança em favor do animal – que, à primeira vista, ele não parecia ter a intenção de matar –, nas circunstâncias do fato.
Importa notar que evoca-se o “estado de necessidade contra algo” e a legítima defesa contra alguém. Dela vamos tratar a partir da questão 11.

6. Cite ao menos dois trechos de jurisprudências sobre o assunto.

Para configuração do estado de necessidade faz-se imperioso o requisito da proporcionalidade entre gravidade do perigo que ameaça o bem jurídico do agente ou alheio e a gravidade da lesão causada pelo fato necessitado.” (TACRIM – SP – Ap. – Rel. Feiez Gattaz – RT 724/686).

“Falta de habilitação para dirigir veículo em via pública – réu que toma veículo emprestado para dirigir-se a hospital onde sua esposa estava em processo de parto – paciente de organismo fraco e que não pode tomar determinados remédios – Informações de ser passadas aos responsáveis pelo parto – estado de necessidade caracterizado – absolvição mantida pela ocorrência desta hipótese.” (TACRIM – SP – Ap. – Rel. René Ricupero – RT 725/593).

7. Quem não pode invocar “estado de necessidade”?

Art. 24 [...] “§ 1 º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).”
“Não pode invocar o estado de necessidade aquele que tem o dever legal de enfrentar o perigo. A expressão dever legal é controvertida para os doutrinadores, uns entendem que se refere somente às hipóteses legais, outros interpretam com amplitude maior. De qualquer sorte, quando a lei impuser dever legal, estará obrigado a salvar o bem ameaçado sem destruir qualquer outro, mesmo que para isso tenha que correr riscos inerentes à sua função. Mesmo assim, quando for nítida a inutilidade do salvamento, o que inutilizaria o risco, a pessoa detentora do dever legal poderá se recusar a cumpri-lo. ‘… de nada adianta o bombeiro atirar-se nas correntezas de uma enchente para tentar salvar uma pessoa quando é evidente que, ao fazê-lo, morrerá sem atingir seu intento…’
Vale relembrar que o Código Penal, no parágrafo 2º do artigo 13, apresenta hipóteses relacionadas ao dever legal de agir, cujo descumprimento enseja a responsabilidade pelo resultado”[3].

8. Fale sobre uma eventual pena e sua redução

Art. 24 [...] “§ 2 º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).”
Haverá pena quando o agente, podendo escolher, opta pelo sacrifício de um bem de maior valor a fim de defender o de menor importância, por exemplo. A pena é aplicada, mas com o benefício da sua redução[4].

9. Trate do estrito cumprimento de dever legal ou do exercício regular de direito.

 “III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”. Escreve Lenoar Medeiros: “A expressão estrito cumprimento do dever legal, por si só, basta para justificar que tal conduta não é ilícita[5], ainda que se constitua típica[6]. Isso porque, se a ação do homem decorre do cumprimento de um dever legal, ela está de acordo com a lei, não podendo, por isso, ser contrária a ela[7]. Noutros termos, se há um dever legal na ação do autor, esta não pode ser considerada ilícita, contrária ao ordenamento jurídico”.
 “Um exemplo possível de estrito cumprimento do dever legal pode restar configurado no crime de homicídio, em que, durante tiroteio, o revide dos policiais, que estavam no cumprimento de um dever legal, resulta na morte do marginal[8]. Neste sentido - RT 580/447[9].”

10. Existe punição para o excesso na excludente de ilicitude?

Sim. No próprio artigo 23 do Código Penal, lemos: “Excesso punível: Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo”.
A redação é clara: quem excede o que está previsto em lei (um policial que neutralizou um criminoso com um tiro na perna, por exemplo, mas lhe dispara mais seis tiros “extras”), não responde, é óbvio, por seu ato lícito em si (até o tiro na perna), mas, sim, pelo ilícito configurado no excesso. E apenas nele.
O excesso pode ser doloso (quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo) ou culposo (quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia). Em algumas situações concretas, pode ser muito complexo saber se houve excesso e – uma vez comprovada a sua existência – se foi com dolo ou culpa apenas.

11. Onde e como está melhor definida a legítima defesa no ordenamento jurídico de nosso país?

Está melhor definida no Código Penal, artigo 25, que diz: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente os meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
A redação é clara e com uma interpretação atenta se pode bem entender esse grande princípio decorrente da própria Lei Natural Moral[10].

12. Como explicitar a legítima defesa à luz da Lei Natural Moral?

Escreve o Dr. Gustavo Holanda Dias que “desde os filósofos da Antiguidade Clássica, já se falava na legítima defesa como um direito sagrado, permitindo-se a violência[11] para repelir a própria violência. Com efeito, o direito de defesa era permitido para a proteção de bens pessoais, como a vida, a integridade corporal, a honra sexual e o patrimônio. O alicerce da legítima defesa repousaria sobre o Direito Natural, o seu fundamento extrajurídico”.
Atribui-se a Cícero, antigo orador romano a seguinte sentença: “est lex non scripta sed nata lex” ou “esta não é uma lei escrita, mas lei natural” (Pro Tito Annio Milone)[12].

13. Qual a razão dada pelo Dr. Gustavo Holanda Dias para que o Estado reconheça ao cidadão o direito à legítima defesa?

Escreve ele que “o Estado, curvando-se à sua impotência para solucionar imediatamente a violação da ordem jurídica, reconhece a possibilidade excepcional da reação instantânea contra uma agressão injusta, eis que não pode obrigar o indivíduo a uma postura de inércia diante da violação de um direito”.

14. Cite a lição de um jurista sobre a importância da legítima defesa ou da reação para o indivíduo.

Guilherme de Souza Nucci escreve, de modo muito lógico: “Valendo-se da legítima defesa, o indivíduo consegue repelir as agressões a direito seu ou de outrem, substituindo a atuação da sociedade ou do Estado, que não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, através dos seus agentes. A ordem jurídica precisa ser mantida, cabendo ao particular assegurá-la de modo eficiente e dinâmico” (Manual de direito penal: parte geral: parte especial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 222).

15. Quais são os requisitos da legítima defesa?

São quatro os requisitos da legítima defesa[13]: a) a reação a uma agressão atual ou iminente e injusta; b) a defesa de um direito próprio ou alheio; c) a moderação no emprego dos meios necessários à repulsa; e d) o elemento subjetivo. Vejamos[14]:

Primeiro ponto: é a reação a uma agressão atual ou iminente e injusta: “a agressão pode ser definida como o ato humano que causa lesão ou coloca em perigo um bem jurídico. A agressão é injusta quando viola a lei, sem justificação (“sine jure”). Agressão atual é aquela que está ocorrendo. Agressão iminente é aquela que está preste a ocorrer”.

Segundo ponto: “Direito próprio ou de terceiro: significa que o agente pode repelir injusta agressão a direito seu (legítima defesa própria) ou de outrem (legítima defesa de terceiro), não sendo necessária, neste último caso, qualquer relação entre eles.”

Terceiro ponto: “Utilização dos meios necessários: significa que o agente somente se encontra em legítima defesa quando utiliza os meios necessários a repelir a agressão, os quais devem ser entendidos como aqueles que se encontrem à sua disposição. Deve o agente sempre optar, se possível, pela escolha do meio menos lesivos.”

Quarto ponto: “Utilização moderada de tais meios: significa que o agente deve agir sem excesso, ou seja, deve utilizar os meios necessários moderadamente, interrompendo a reação quando cessar a agressão injusta.”

Quinto ponto: “Conhecimento da situação de fato justificante: significa que a legítima defesa requer do agente o conhecimento da situação de agressão injusta e da necessidade de repulsa (“animus defendendi”)”.

16. Existe legítima defesa recíproca?

Não. “Um dos requisitos da legítima defesa é a agressão injusta repelida por uma reação lícita, de forma que é impossível a defesa lícita entre ambos os contendores”. Isso é lógico, pois se A ia atacar ou atacou B e este reagiu de modo proporcional ao ataque, sua ação foi de legítima defesa ao passo que o ato de A é crime.

17. A legítima defesa pode ser desproporcional?

      Sim, “será desproporcional – não configurando legítima defesa – a conduta de quem não usar moderadamente dos meios necessários ou se valer de meios desnecessários para repelir injusta agressão”[15].
      Seria o caso de quem, ante uma criança com um estilingue, usasse uma metralhadora para afastá-la (leia-se “destroçá-la”). Não há, aí, a mínima proporção.

18. Que seria legítima defesa putativa?

Em casos nos quais não há agressão injusta, fala-se em legítima defesa putativa, que se contrapõe à legítima defesa real. A legítima defesa putativa ou imaginária não é culposa, é dolosa. Dar-se-ia no caso em que C se julga perseguido por D e o ataca. É algo absurdo e não real legítima defesa. C terá, via de regra, de responder, criminalmente, por sua agressão.

19. A lei permite defender-se de inimputáveis?

Sim. Por inimputáveis se entende aqui pessoas não puníveis, especialmente doentes mentais graves, pessoas de desenvolvimento mental incompleto ou retardados, de acordo com o artigo 26 do Código Penal. Se eles atacam alguém, o atacado pode, tranquilamente, se defender, como se defenderia de qualquer outra pessoa, pois há, de modo objetivo, um ataque injusto atual ou iminente.
Quem se defende – diz-se – deve ter maior cuidado com os inimputáveis, mas isso – a nosso ver – só é possível se ele souber do histórico de quem o agrediu ou tentou agredir.

20. Há legítima defesa sucessiva?

Sim. Ela “ocorre quando o agressor inicial passa a ser considerado como vítima e se verifica na hipótese em que há excesso na defesa ou abuso de defesa. Assim, o agredido, em exercício de seu direito de defesa, excede-se na repulsa, de modo que o agressor inicial passa a ser considerado como vítima, possuindo o direito de defender-se do excesso”. A ia agredir B que reagiu, mas exagerou na reação. A pode defender-se dos excessos de B.

21. Como o artigo 23 do CP trata do “excesso de defesa”?

O art. 23, parágrafo único, do Código Penal, trata do excesso de defesa, que pode ser observado sob duas modalidades: dolosa e culposa. O excesso doloso ocorre quando o agente continua no contra-ataque apesar de haverem cessado as agressões, por querer mais lesões ou a morte do agressor inicial, bem como na hipótese de, já cessada a agressão, continua na sua defesa acreditando estar amparado pelo direito no seu intuito de ir até as últimas consequências (erro sobre os limites da causa de justificação). O excesso culposo ocorre quando o agente avalia mal a situação e dá continuidade à repulsa ou quando avalia mal a situação, excedendo-se quanto à gravidade do perigo ou modo de reação. Na prática, parece um tanto difícil o limite entre excesso doloso e culposo.

22. Pode-se defender de provocação verbal?

Escreve Dr. Guilherme de Souza Nucci o que segue: “A honra é um direito fundamental, constitucionalmente assegurado. O Direito Penal a tutela também nos artigos 138, 139 e 140 do Código Penal. Assim sendo, quem estiver ofendendo a honra alheia pode ser obstado tanto pela vítima quanto por terceiro, em nome da legítima defesa da honra”.
“A legítima defesa (art. 25, CP) exige agressão injusta (ilícita) contra direito próprio ou de terceiro, feita no presente (atual) ou em futuro próximo (iminente). Portanto, se Fulano profere injúrias verbais seguidas contra Beltrano, torna-se viável que este se defenda, usando os meios necessários, moderadamente. Ilustrando, pode colocá-lo para fora de sua casa ou do estabelecimento comercial de sua propriedade. Pode chamar a polícia. Pode até mesmo desferir-lhe agressão física leve.”
“Entretanto, jamais se pode matar ou causar lesão grave ou gravíssima a pretexto de defender a honra, porque esta atitude ofenderia a proporcionalidade exigida no cenário da legítima defesa. A honra, por se tratar de bem jurídico imperecível, pode ser defendida, mas com redobrada moderação. Não mais se acolhe, no direito contemporâneo, a ideia de lavar a honra com sangue.”
“Em suma, ninguém é obrigado a ouvir calado calúnia, difamação ou injúria, sem nada poder fazer, diante da agressão injusta e atual. Mas deve imperar o bom-senso, impondo-se a moderação para a sua defesa.”[16]

23. Há, às vezes, erro na legítima defesa?

Sim. “Ocorre o excesso por erro de tipo escusável. O agente, inicialmente em legítima defesa, já tendo repelido a injusta agressão, supõe, por erro, que a ofensa ainda não cessou, excedendo-se nos meios necessários. O erro de tipo escusável exclui o dolo e a culpa”[17].

24. Que dizer da legítima defesa na seara civil?

“O reconhecimento da legítima defesa tem implicações relevantes na seara cível. De acordo com o art. 65, do Código Processual Penal Brasileiro, quando a absolvição criminal do acusado está fundamentada numa excludente de ilicitude, resta prejudicado o exercício de ação cível, notadamente as de cunho indenizatório ou reparatório[18]. Ainda, segundo a norma gizada no art. 188, incisos I e II, do Código Civil Brasileiro, não constituem atos ilícitos os praticados em legítima defesa, estado de necessidade ou no exercício regular de direito[19]”.
“Interpretando-se conjuntamente os dispositivos acima invocados, na hipótese de o acusado ser absolvido com fundamento em causa excludente da ilicitude, a matéria não será mais objeto de perquirição no âmbito cível[20].”
“Quanto aos reflexos processuais penais, algumas considerações são indispensáveis. A lei processual penal exige que o reconhecimento judicial da legítima defesa esteja expresso na sentença penal[21].”
“Ademais, após a citação para apresentação da defesa escrita, o juiz poderá absolver sumariamente o acusado quando verificar a existência de manifesta causa excludente da ilicitude. A absolvição sumária somente se justifica quando não houver qualquer dúvida acerca de sua existência, daí porque a legislação utiliza o termo ‘manifesta’, dando-nos a compreensão de que a dúvida, neste caso, interpretar-se-á, pro societate[22].”[23]

25. Como entender e usar “ofendículos”? São legais?

“Por fim, merecem ser lembradas as ofendicula (ou ofendículos), que são barreiras ou obstáculos para a defesa de bens jurídicos. Geralmente constituem aparatos destinados a impedir a agressão a algum bem jurídico, seja pela utilização de animais (cães ferozes, por exemplo), seja pela utilização de aparelhos ou artefatos feitos pelo homem (arame farpado, cacos de vidro sobre o muro e cerca eletrificada, por exemplo). Parcela da doutrina distingue ofendicula de defesa mecânica predisposta. As ofendicula são percebidas com facilidade pelas pessoas e não necessitam de aviso quanto à sua existência. Exs.: cacos de vidro sobre o muro, pontas de lança em uma grade, fosso etc. Já as defesas mecânicas predispostas estão ocultas, ignoradas pelo suposto agressor, sendo necessário o aviso quanto à sua existência. Exs.: cerca eletrificada, armadilhas em geral, arma oculta, cão feroz etc. A Lei n. 13.477/17 dispõe sobre a instalação de cerca eletrificada ou energizada, em zonas urbana e rural, estabelecendo os cuidados e procedimentos a serem observados.”
“Constituem as ofendicula hipóteses de legítima defesa preordenada, que atuam quando o infrator procura lesionar algum interesse ou bem jurídico protegido, embora alguns doutrinadores sustentem constituírem elas exercício regular de direito.”
“A meu ver, entretanto, a melhor solução é considerar a mera instalação, utilização ou predisposição das ofendicula como exercício regular de direito (direito de se autodefender); quando efetivamente atuarem essas barreiras ou obstáculos, vulnerando o bem jurídico do injusto agressor, serão consideradas legítima defesa preordenada”.[24]

Convite

Se este breve estudo lhe interessou, queira divulgá-lo entre as pessoas de bem. A informação, no momento de calmaria, é útil para a ação correta nas horas turbulentas. O mal (e os maus) não pode ter, jamais, a última palavra. E não terá... com a graça de Deus e o esforço de cada um de nós.



[1] Revisão: Dr. Felipe Bertazzo Tobar, advogado, professor de Direito, escritor, mestre em Patrimônio Cultural e doutorando pela Clemson University (EUA), com o seguinte comentário ao autor: “Pode ser professor de Direito Penal! Muito bom! Sem correções!!” (E-mail de 07/04/19).
[2] Diferente, por exemplo, do artigo 181 do CP que diz: “É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo: I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural”.
Note-se a expressão “Isento de pena”, ou seja, o crime existe, mas não é punido. Assim, o filho que furta R$ 1.000,00 do pai comete o crime de furto (art. 155 do CP), mas não recebe punição, embora o crime exista.
É a, tecnicamente, dita “escusa (desculpa) absolutória” muito diferente, como se vê, da “excludente de ilicitude”.
[5] Ou seja, está plenamente de acordo com a lei. É, portanto, lícita.
[6] Mesmo que, se cometida por outro agente em situação diferente, seja tipificada como crime. É o caso do homicídio tratado pelo autor que estamos seguindo.
[7] É absurdo lógico algo ser legal e ilegal ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto.
[8] A morte de alguém, ainda que marginal, em outras circunstâncias (uma clara execução, por exemplo) é crime, mas na ação de um agente da lei a revidar tiros disparados por bandidos, não é.
[10] Ver: Vanderlei de Lima. Obedecer antes a Deus que aos homens: a ética cristã do lado dos que defendem a objeção de consciência como um direito humano fundamental. Amparo: Ed. do Autor, 2013, p. 32-51.
[11] O termo violência nos parece, no caso, mal empregado. Afinal, “não se pode, portanto, chamar [de] ‘violência’ qualquer uso da força, mas só o uso injusto, que lese um direito. Assim, um Estado que recorra à força para impor a aplicação de leis justas ou para punir quem as tenha violado com grave prejuízo para o bem comum, não comete violência, desde que se mantenha dentro dos limites da justiça” (Curso de Doutrina Social da Igreja. Rio de Janeiro: Mater Ecclesiae, 1992, p. 214). Isso se dá quando as forças de segurança (Polícia Militar, Guarda Civil Municipal ou Exército), por exemplo, têm de agir para desobstruir uma via pública já tomada por arruaceiros ou trocar tiros com criminosos etc. Aqui, só ocorrerá o que se poderia chamar de violência propriamente dita se as forças de segurança forem além do necessário no uso dos meios legítimos na ação (atirar pelas costas em um sujeito rendido e algemado, no caso).
[13] https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=LEG%C3%8DTIMA+DEFESA+-+ART.+23+DO+CP+POLICIAL+MILITAR&
[14] Aqui, Dr. Ricardo Antônio Andreucci. https://emporiododireito.com.br/leitura/legitima-defesa-caracteres-requisitos-e-especies, acesso em: 18/01/19.
[18] É óbvio. Se A foi injustamente agredido por B, pode requerer indenização, mas se A agiu em legítima defesa, a indenização ou reparação do “dano” não existe.
[19] Claríssima a explanação.
[20] Sim, é óbvio, já teve fim ou desfecho.
[21] Para clareza legal certa.
[22] A favor da sociedade.

Comentários

  1. Excelente trabalho! Irretocável... indicado para estudo e reflexão nas salas de aula e também nas salas de instrução destinadas aos integrantes de forças policiais.

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